A conclusão de uma
auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), assinada na última
segunda-feira, 6, pelo Auditor Federal de Controle Externo Carlos Wellington
Leite de Almeida, revela a ocorrência de sobrepreço/superfaturamento, e o
possível exercício mercantilista da medicina no contrato de mais de R$ 34
milhões assinado entre a Secretaria Estadual de Saúde do Acre (Sesacre) e a
empresa Medtrauma para assistência à saúde na área de traumatologia/ortopedia,
para atender às demandas de atendimento de urgência e emergência, adulto e
pediátrico. As denúncias do contrato assinado pela Sesacre e que resultou em
“caronas” das secretarias estaduais de saúde de Mato Grosso e Roraima foi
denunciado pelo Fantástico, da Rede Globo, em fevereiro deste ano.
O relatório aponta que os
fortes indícios de sobrepreço e superfaturamento foram inicialmente
identificados a partir do minucioso trabalho da Controladoria-Geral da União
(CGU), no Estado do Acre e afirma que o possível superfaturamento decorreria,
essencialmente, da redundância indevida no pagamento de procedimentos
cirúrgicos.
O relatório explicita
ainda que no que se refere à possibilidade de exercício mercantilista da
medicina pelos médicos sócios da Medtrauma, por se tratar de irregularidade
afeta ao exercício profissional dos médicos, propõe-se diligenciar o Conselho
Federal de Medicina (CFM), para que adote as providências cabíveis, no âmbito
de suas competências, fixando o prazo de 30 (trinta) dias para que informe as
medidas adotadas ao TCU.
Como encaminhamento, a
auditoria do TCU define um prazo de 15 dias para que a então secretária de
Saúde do Acre, no ato da assinatura do contrato, Paula Augusta Maia de Faria, o
então Chefe do Departamento de Regulação Controle e Avaliação da Sesacre, Michel
Ribeiro Paes, e o responsável pela coleta de preços e elaboração do preço de
referência, Antônio Diego de Lima Felix, apresentem suas justificativas.
A auditoria explicita
ainda as irregularidades, a conduta e possível culpabilidade dos três gestores
Antônio Diego de Lima
Felix – Irregularidade: elaboração, na condição de responsável pela coleta de
preços, do preço de referência do Pregão Eletrônico 121/2022/Sesacre (SRP), no
valor de R$ 34.591.666,67, inflado diante da não-retirada do valor destoante de
R$ 56.200.000,00 apresentado pela Medtrauma Serviços Médicos Especializados
Ltda, quando da cotação inicial, levando à assinatura da Ata de Registro de
Preços ARP 199/2022/Sesacre, com a posterior contratação de serviços por preços
injustificadamente elevados.
Conduta: Elaborou o preço
de referência que, indevidamente inflado, resultou na assinatura da Ata de
Registro de Preços ARP 199/2022/Sesacre, com a posterior contratação de
serviços por preços injustificadamente elevados e na contratação da Medtrauma
Serviços Médicos Especializados Ltda, no âmbito do Contrato 563/2022/Sesacre
(Medtrauma) e de outros contratos por “adesão- carona”, com preços
injustificadamente elevados e resultando em dano ao erário.
Culpabilidade: o TCU diz
que era perfeitamente possível ao então responsável ter conhecimento do vício
pela sua gravidade, vez que, sendo ele próprio responsável pela elaboração do
mapa comparativo de preços, não poderia deixar de perceber, entre os únicos
três valores coletados, um deles extremamente destoante dos demais, a saber, R$
56.200.000,00 (Medtrauma) contra R$ 25.075.000,00 (Ortotrauma) e R$
22.500.000,00 (INAO), justamente o da Medtrauma, que inflacionou o resultado e
acabou por ser contratada.Normas violadas: Lei 8.443/1992, artigo 8° (dano ao
erário); Decreto 10.024/2019, artigo 3o, inciso IX, alínea “a”, subalínea 2
(termo de referência com preços de mercado).
Michel
Ribeiro Paes – Irregularidade: elaboração e aprovação,
na condição de Chefe do Departamento de Regulação Controle e Avaliação da
Sesacre, dos Termos de Referência 56/2022/Sesacre e 87/2022/Sesacre, ambos
referentes ao Pregão Eletrônico 121/2022/Sesacre (SRP) e à Ata de Registro de
Preços ARP 199/2022/Sesacre, eivados dos vícios a seguir:
a) preço de referência de
R$ 34.591.666,67, inflado diante da não-retirada do valor destoante de R$
56.200.000,00, apresentado pela Medtrauma Serviços Médicos Especializados Ltda
quando da cotação inicial, levando à assinatura da Ata de Registro de Preços
ARP 199/2022/Sesacre, com a posterior contratação de serviços por preços
injustificadamente elevados (item 52.2). b) não-previsão da possibilidade de
fornecimento das OPMEs por outra empresa que não a contratada para a realização
dos procedimentos cirúrgicos, caracterizando a ausência do parcelamento
obrigatório do objeto da licitação, sem que houvesse a demonstração de prejuízo
para o conjunto da contratação ou perda de economia de escala, assim perdendo
economicidade e favorecendo modelagem contratual que incentiva o contratado a
realizar serviços e prever materiais mais caros e, até, desnecessários, para
aumentar o faturamento.
Conduta: Elaborou e
aprovou os termos de referência que, eivados de vícios, resultaram na Ata de
Registro de Preços ARP 199/2022/Sesacre, com a posterior contratação da
Medtrauma Serviços Médicos Especializados Ltda, no âmbito do Contrato
563/2022/Sesacre (Medtrauma) e de outros contratos por “adesão-carona”, com
preços injustificadamente elevados, bem como favoreceram o exercício
mercantilista da medicina, com dano ao erário,
Culpabilidade: era
perfeitamente possível ao então Chefe do Departamento de Regulação Controle e
Avaliação da Sesacre ter conhecimento dos vícios contidos nos termos de
referência, por três motivos, a saber: a gravidade das irregularidades, a
expressa previsão legal e a possibilidade de verificação. a) no que se refere
ao preço de referência, a gravidade da irregularidade está em que o aludido
preço, disposto no mapa comparativo da cotação de preços, inclui apenas três
valores coletados, sendo um deles extremamente destoante dos demais, a saber,
R$ 56.200.000,00 (Medtrauma) contra R$ 25.075.000,00 (Ortotrauma) e R$
22.500.000,00 (INAO), justamente o da Medtrauma, que inflacionou o resultado e
acabou por ser contratada.
Em relação aos dois
vícios apontados, havia a possibilidade de verificação, vez que não se tratavam
de vícios ocultos, de difícil detecção, não sendo necessário ao então chefe de
departamento imiscuir-se na conferência detalhada de vários documentos, mas,
tão-somente, ter razoável conhecimento da Lei 8.666/1993 e ler com um mínimo de
atenção apenas um documento: o mapa comparativo da cotação de preços.
Paula
Augusta Maia de Faria Mariano – Irregularidade: na
condição de Secretária de Estado da Saúde do Acre, homologação do Pregão
Eletrônico 121/2022/Sesacre (SRP), bem como celebração da Ata de Registro de
Preços ARP 199/2022/Sesacre, elevados eivados dos vícios a seguir:
a) preço
de referência de R$ 34.591.666,67, inflado diante da não-retirada do valor
destoante de R$ 56.200.000,00, apresentado pela Medtrauma Serviços Médicos
Especializados Ltda, quando da cotação inicial, levando à assinatura da Ata de
Registro de Preços ARP 199/2022/Sesacre, também de sua lavra, com a posterior contratação
de serviços por preços injustificadamente elevados.
b) não previsão da possibilidade de
fornecimento das OPMEs por outra empresa que não a própria contratada para a
realização dos procedimentos cirúrgicos, caracterizando a ausência do
parcelamento obrigatório do objeto da licitação, sem que houvesse a
demonstração de prejuízo para o conjunto da contratação ou perda de economia de
escala, assim perdendo economicidade e favorecendo modelagem contratual que
incentiva o contratado a realizar serviços e prever materiais mais caros e,
até, desnecessários, para aumentar o seu próprio faturamento.
c) injustificada eliminação de todas as
licitantes que ofertaram preços menores que os da Medtrauma Serviços Médicos
Especializados Ltda.
Conduta: no âmbito do Pregão Eletrônico
121/2022, homologou o aludido procedimento licitatório, eivado de vícios,
resultando na Ata de Registro de Preços ARP 199/2022/Sesacre, também de sua
lavra, com a posterior contratação da Medtrauma Serviços Médicos Especializados
Ltda, no âmbito do Contrato 563/2022/Sesacre (Medtrauma) e de outros contratos
por “adesão-carona”, com preços injustificadamente elevados, bem como favorecendo
o exercício mercantilista da medicina, assim incorrendo em culpa in eligendo e
culpa in vigilando com relação aos atos de seus agentes subordinados ou
colaboradores e resultando em dano ao erário.
Culpabilidade: era perfeitamente possível
à então secretária da Sesacre ter conhecimento dos vícios do processo
licitatório, por três motivos, a saber: a gravidade das irregularidades, a
expressa previsão legal e a possibilidade de verificação, com o apoio de sua
assessoria especializada.
a) No que se refere ao preço de
referência, a gravidade da irregularidade está em que o aludido preço,
elaborado e aprovado em termo de referência inclui apenas três valores
coletados, sendo um deles substancialmente destoante dos demais, a saber, R$
56.200.000,00 (Medtrauma) contra R$ 25.075.000,00 (Ortotrauma) e R$
22.500.000,00 (INAO), justamente o da Medtrauma, que inflacionou o resultado e
acabou por ser contratada.
b) No que se refere à eliminação de todas
as licitantes que ofertaram preços menores que os da Medtrauma, a gravidade da
irregularidade está em que não se tratou da discreta eliminação de uma única
participante isolada, mas sim da eliminação sistemática de todas as demais
licitantes que concorreram com a Medtrauma.
c) No que se refere à ausência do
parcelamento obrigatório do objeto da licitação existe expressa previsão legal
dessa na Lei 8.666/1993, então vigente.
d) No que se refere aos três vícios acima
apontados, havia a possibilidade de verificação, vez que não se tratavam de
vícios ocultos, de difícil detecção, não sendo necessário à então secretária
imiscuir-se na conferência detalhada de vários documentos, mas, tão-somente,
com o apoio de sua assessoria especializada, ler com um mínimo de atenção
apenas quatro documentos: os dois termos de referência, o mapa comparativo da
cotação de preços e a ata do resultado do pregão, todos elaborados por seus
próprios subordinados na Sesacre ou por seus colaboradores na Selic .
Por fim, o TCU determina que o resultado da auditoria
seja encaminhado para o Conselho Federal de Medicina, ao Tribunal de Contas do
Estado do Acre, ao Tribunal de Contas do Estado de Roraima, ao Tribunal de
Contas do Estado de Mato Grosso, à Superintendência da Polícia Federal no
Estado do Acre, à Superintendência da Polícia Federal no Estado de Roraima, à
Superintendência da Polícia Federal no Estado de Mato Grosso e à
Controladoria-Geral da União.
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